segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Do Sacrossanto Ensino Público

Hoje o «i» dá conta de que há cada vez mais colégios e escolas privadas cujas propinas não são pagas por pais que se viram sem os habituais recursos económicos.

De facto, transferir uma criança do ensino privado para o ensino público, pode ser um choque elevado, quiçá fonte de traumas futuros. Na escola, como na família, criam-se laços, alianças, territórios, ódios de estimação, etc. E cada ecossistema escolar é delicado. Se mudar de escola no termo de um ano lectivo e antes do início do segundo é uma alteração profunda na vida de uma criança ou adolescente, mais ainda o será durante o próprio ano lectivo.

Dito isto, certo é que na bela nação em que vivemos, se criou o cultozinho dos betinhos priveligiados nas escolas e colégios do sector privado. Subtraídos à convivência com os putos ranhosos que às vezes não têm o livro de texto porque os pais «ainda não receberam», que almoçam graças à acção social escolar, andam mal vestidos e até sujos, têm maus modos, são tendencialmente problemáticos e danados de manter sossegados. Enfim, os filhos do povacho. Aquele que não anda a ganir porque o leasing do SUV vai de vela, já não há férias no estrangeiro e visa para pagar as farpelas com etiquetas que significam «produto carote».

O povacho, remediado e com um futuro tão risonho como o Ramalho Eanes, sempre mandou os seus filhos para a sacrossanta Escola Pública. Com todos os seus defeitos e virtudes. Simplesmente por não haver guito para mais, acredito. Mas foi nessas escolas que muitos desses petizes se fizeram homens e mulheres melhores do que os seus pais. Porque ainda há professores que fazem a diferença. Porque na escola pública, apesar de tudo, se tratam de forma mais igual as pessoas. Duvido que os filhos do povacho se dessem bem em colégios privados.

Já os meninos dos colégios privados, filhos de pessoas que, contra todas as expectativas, se nivelaram economicamente com o povacho, parecem querer ser poupados pelos seus pais e educadores ao triste fado da frequência do ensino público.

É nisto que os priveligiados se distinguem do povacho: este, quando não tem, não finge que tem. Não estica a corda até à humilhação. Aprende a viver sem aquilo que não pode ter e sabe ser feliz na adversidade.

Porque a refeição social e a escola pública são um bem inestimável, invista-se e revalorize-se o que é público, de todos nós. Que as crianças dos pobres dignos, se acaso tiverem alguns dos professores que tive a sorte de encontrar do outro lado da sala, serão felizes na magreza orçamental e gente adulta que jamais manteria um filho numa escola privada cujas propinas não pudesse pagar pontualmente.