terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Das Estreias Televisivas de 2010 II


A AMC teve o seu momento Manuel Alegre no dia em que decidiu cancelar a magnífica série «Rubicon». As conspirações dos 70's podem orgulhar-se desta revisitação. E o bom público, fiel e satisfeito, bem pode reclamar o direito potestativo de pregar um par de chinadelas no esperto da ideia.

Mas sempre que se dá aos espectadores, não aquilo que eles pretendem, mas uma história que, ao invés de ir ao encontro de padrões tipificados, antes revela a trama e dispõe a acção a seu bel-prazer, ou seja, quando se é autêntico antes de procurar um modelo de eficiência pré-concebido, tende-se, por via de regra, ao fracasso estatístico.

E assim sucedeu a esta bela narrativa de conspiração, cujas personagens quase sempre exemplarmente interpretadas - destacando-se Arliss Howard, James Badge Dale, Michael Cristofer e Miranda Richardson - são dotadas de substância, ao invés de conflitos plásticos, funcionam em tempo distintos, cruzando-se numa sincronia incidental. Não procuram o sentido da vida nem tão pouco cavalgam em demandas inexequíveis. Nem mesmo quando se convencem de o estar a fazer.

Além de ser altamente viciante, «Rubicon» tem a propriedade de não maltratar intelectualmente ninguém. Não é conspiração para tótós, mas também não deixa o espectador com complexo de asnice. E isso, só por si, vale muito. Cada vez mais o espectador é um ente vitimado pelos mais vis dos abusos. [Tomem-se como exemplo as sintomáticas «Flashforward» e «The Event», vãs tentativas do hype «Lost».]

Com «Rubicon» nunca se é violentado pelo ímpeto «queremos ser a nova "Lost"» dos senhores argumentistas. De algum modo, será mesmo o contrário. A trama obedece a um classicismo de ideias francamente humilde, a narrativa bifocada é que lhe empresta algum dinamismo atípico.

Tem somente o defeito de uma decapitação precoce - foi cancelada pela AMC - e os efeitos de tal pressão sentem-se no termo do último de 13 episódios de muito, muito boa televisão.
Mesmo assim é um final só 20 vezes melhor do que aquele com que «Lost» foi terminado em moldes de obra pública.

Em suma: uma bela série que merece todo o tempo que se passe a visioná-la. Pessoalmente, a minha série (estreante em 2010) preferida.